O ESTRANHO MUNDO DE BITTENK
Milton Bittencourt
Depoimento Verídico de Ex-Viciado
"Quando criei meu fotolog, não imaginei que entraria de cabeça num mundo secreto e ao mesmo tempo absurdamente público. Onde vício e superficialidade andam lado-a-lado com curiosidade mórbida e auto-conhecimento". Uau, uma chamada dessa merecia era um filme! Mas, não é isso. Este depoimento foi misteriosamente entregue em minha caixa de correio em fitas gravadas que transcrevo aqui sem alterações e sem me comprometer e...ah, sem essa, o depoimento é meu mesmo, "enquanto fotologger".
Criei o /bittenk há um ano atrás por impulso e por agradar muito de fotografia. Daí, no mesmo dia decidi que eu era fotógrafo profissional e comecei meu porftólio virtual, com um ensaio bem despretensioso pelas ruas da cidade. Despretensioso tipo "sou o novo Cartier-Bresson". Buscando a "expressão das pessoas, movimento do dia-a-dia, essas coisas". Dessa fase, tem também umas fotos de cemitério que são o cúmulo da pretensão artística.
Claro que não foi suficiente, e logo me debandei para o preto-e-branco, mais clássico, sabe? Mas essa linha "fina" estava por ruir com a chegada do meu aniversário e um sentimento de jogação que tomou conta de mim pelo resto do ano. Aí, passei a clicar dias e noites de electro e toda a jogação envolvida. Festinhas, bares, os queridos amigos, onde tocava ou se falava da Gigolo Records lá estava eu na máquina digital. Tudo alternado com dias de introspeção e tendências depressivas, lógico. Descobri e registrei coisas e pessoas novas e a noite do The Hacker na Bunker. Descobri uma musa: Gizele (aquela da música "Feriado", da internet). Descobriram que sou louco, só porque enrolei dois amigos em plástico para um mini-manifesto. Nessa época, eu estava era viciado no site e com o dedo doendo de tanto pressionar o botão "refresh" do computador. E, confesso, cheguei a acompanhar a vida de algumas pessoas também (atire a primeira pedra!).
Nos dias de menos criatividade, mostrei os filmes que vi (foram muitos), minhas referências musicais e conceituais, e aí foram imagens do Gus Gus da minha música do coração, o cd do Felix da Housecat com a Miss Kittin, Kraftwerk, DJ Hell e também La Chapelle, David Hopper, muitos cartoons e o que mais eu considerava bacana. Claro que rolaram imagens sem nenhuma graça também.
Num determinado momento, decidi que eu tinha uma proposta também: "uma nova visão do mundo em imagens de cores saturadas e momentos supercool". E desse jeito passei meses registrando e dando perfeição estética a tudo o que fiz: viagem pra Ouro Preto, táxi no centro de noite, festinha particular em condomínio fechado, restaurante podrão em dia de Tim Festival. Peguei a estranha mania de construir a realidade e saíram imagens de um mundo "com acabamento".
Fotolog na mídia, inchado de gente, e eu em Florianópolis, numa fase mais "naturalista": sem correções de cor, tipo "a vida como ela é" (na verdade: muito sol, pouco tempo para retoques). Acho que dá pra ver que me perdi um pouco em melancolia e saudades logo depois. E no Shag, um ilustrador inglês que manda muito bem, fiquei viciado nele por um tempo. As fotos foram ficando mais naturais, e mais mescladas com outras imagens.
E agora... não sei o que vai ser, lógico. Talvez largue isso, já parei de pagar pra ser "gold member". O /bittenk sobrevive, entre altos e baixos. O que vale é poder ver como foi "o ano em que estive no fotolog", ter isso palpável. O resultado é meio caótico, vários conceitos às vezes inconsistentes, mas diz muito de como eu sou, do que eu fiz e do que se passa pela minha cabeça. Que, fui perceber, (momento análise) funciona pensando em círculos. Fica orbitando em volta das minhas referências. Claro que sempre surgem referências novas, mas não é simples se desprender de certas maneiras de pensar, mesmo conscientemente. Também tirei a prova que realmente eu tenho uma estranha tendência tanto para o trash quanto para o fino.
Daí que por mais bobo que seja o fotolog, deu pra pensar um pouco e me divertir horrores com isso tudo. "Não me arrependo de nada" e digo que, hoje em dia, consigo usar socialmente, tipo "só por mais 24 horas".
Nenhum comentário:
Postar um comentário